O maior problema da televisão por assinatura é que de modo geral os canais funcionam 24 horas. E quando eventualmente um ou outro sai do ar, em seu lugar entra um lettering qualquer, com uma música ao fundo ou mesmo música alguma. Ao contrário das emissoras de sinal aberto, não ficam com aquelas "formiguinhas" na tela e nem com o chiado característico.
Isto significa que meu aparelho de televisão invariavelmente passa a noite inteira ligado. Adormeço assistindo algum interessantíssimo programa qualquer e nenhum ruído me desperta para que eu desligue a TV. Isto, noite após noite, contribui para a elevação do percentual de desperdício de energia elétrica, um dos maiores problemas da atualidade.
Noite dessas adormeci enquanto assistia a um destes animados eco-programas do Discovery ou GNT e tive pesadelos terríveis. Até onde lembro, o programa tratava da questão energética. Dizia o locutor, em sua monocórdica e hipnótica voz, que o aumento do consumo de energia levava à construção de novas hidrelétricas e suas conseqüentes represas. Explicava como estas represas acarretam danos ambientais ao desalojarem a fauna nativa, afundarem a fauna e coisas mais. Davam outros exemplos mas, confesso, já pestanejava nesta hora.
E do simples pestanejar caí no sono. E, talvez embalada pelo áudio do programa, começou o pesadelo. Em meu sonho eu dormia, com a TV ligada, enquanto quase arrombavam minha porta. Era um bando de ecologistas ensandecidos, gritando palavras ameaçadoras contra euzinha aqui. Propagavam ao prédio inteiro meu egoísmo e ameaçavam atos terroristas como cortar a ligação elétrica de meu apartamento. A situação era de pânico e eu nada fazia por medo e por, no fundo, achar que até tinham alguma razão. Mas era assustador sentir-me aprisionada em minha própria casa.
Como a grande vantagem do pesadelo sobre o cotidiano é que do primeiro a gente acorda, acordei. Tomei um chá de camomila e voltei a dormir tranqüilamente. No dia seguinte, extenuada, não rendi muito no trabalho. Entre um café e outro pensei que seria bom morar nos Estados Unidos. Ao menos resolveria um problema.
Se eu morasse nos Estados Unidos não me preocuparia com o baixo rendimento no trabalho. Depois de sucessivos pesadelos provocados pelos eco-chatos programas da TV a cabo, constituiria um advogado e entraria com uma milionária ação na insuspeita justiça americana.
Embasada em laudos médicos provaria que a exposição a este tipo de programa está afetando meu repouso, perturbando meu rendimento profissional e arrancaria da operadora de TV a cabo uma quantia que permitisse comprar um catamarã para viver nele entre as ilhas da Micronésia. E desta forma cumpriria meu destino, que é o de terminar a vida como uma velha loba do mar.
Se o dinheiro fosse suficiente, talvez comprasse um bom equipamento e tentasse, como agradecimento pelo dinheiro recebido, produzir uns programinhas melhores. Uns que não provocassem sono, pesadelo e nem as ameaça de linchamento pelo verdadeiro mundo animal.