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Em 2021 li mais do que minha meta anual de sempre... o que em geral sempre acontece. MAS... vou confessar algo íntimo aqui. Só neste ano li a tetralogia da Elena Ferrante, o que pode parecer curioso para alguém que tem o hábito de ler.

Pois bem... não havia lido porque do alto (ou baixo) da minha arrogância, jogava Elena Ferrante na valeta da "subliteratura". Isso mesmo. Sou pedante, pernostica, preconceituosa... whatever.Li o primeiro e gostei, o 2⁰, 3⁰ e 4⁰. Tudo em menos de um mês. 1690 páginas, 57 por dia (alô praqueles que acharam absurdo Lula ler 50 páginas por dia na prisão. Eu tb estava presa em casa).

Gostei muito. Não conclui se Ferrante deixou, pra mim, de fazer subliteratura ou se eu sou uma subleitora. Tanto faz. Qualquer hipótese partiu minha arrogância e me tornei pessoa melhor.

A grande vantagem de ter um blog inexpressivo como este é que posso escrever o que quiser, sem medo de apanhar da humanidade. Por exemplo: posso dizer que desde que me conheço por gente acho a chamada vanguarda paulista (de todos os tempos) chata. De Itamar/Arrigo a todas novidades que percorrem o circuito cultural da modernidade ultra cabeça do tipo Petit, Becker, Aidar etc.

Eu não estou dizendo que são ruins. São bons. Apenas os acho chatos. Também não quero que sumam e parem de trabalhar. Ao contrário, que prosperem. Posso achar chato? Posso achar o que eu quiser?

Só não entendo, acompanhando o imbroglio que envolve Alvaro Pereira Jr., da FSP,  porque os adoradores deste povo podem malhar Restart e Claudia Leite (e faço coro a eles) mas o mesmo não pode ser feito com os queridinhos do universo alternativo-cabeça-universitário.

Sei que o jornalista fez insinuações/considerações políticos-econômicos... mas me irrita observar que este país anda num processo crescente de democracia "só para mim".

Só para o que "eu" penso e acredito.

Sobre o  kit anti-homofobia, que os fundamentalistas chamam de "kit-gay" não me manifesto pois não o vi com atenção devida. Mas tenho o maior orgulho de ter prestado serviço para uma escola que lidou exemplarmente com a questão há uns 10 anos, quando o tema nem em pauta estava.

Havia na escola um menino, com cerca de 12 anos, de trejeitos claramente afeminados. Seus coleguinhas começaram a tecer uma ou outra piadinha a seu respeito. Foi o que bastou para que a diretora pedagógica da escola imediatamente tomasse uma conduta, ao invés de fechar os olhos. Castigo? Bronca? Nada disso.

Ela locou o então recém lançado (no Brasil) filme francês  "Minha Vida em Cor de Rosa" e passou para os alunos. Passou para todos os alunos, em geral. E naquele mês o tema foi "diferenças".

O princípio de perseguição parou ali mesmo. Sem drama e sem consequências .

Este é um dos meus orgulhos: saber pra quem trabalho.

Preconceito é tema em voga. Crescem as denúncias contra manifestações discriminatórias, físicas ou psicológicas, pra cima de gays, negros, gordos... Os casos Bolsonaro e Michael, do volei, só levaram um início de discussão para o horário nobre da TV, mas o tema já está nas bocas e teclados há muito tempo.

E no acalorado das discussões surgem opiniões simplistas e simplificadoras de tudo quanto é lado. Do "não quero que as crianças sejam influenciadas pela promiscuidade homossexual" a até uma parcela, espero que pequena, do mundo gay que divide a raça humana entre homossexuais e enrustidos. É o tradicional "se ele se preocupa tanto com gays é por que ai tem". Não necessariamente.

Vou simplificar do meu jeito também.

Fala-se muito que as pessoas não aceitam as diferenças. Não acho que o problema esteja ai. Penso até que elas amam as diferenças. Fomentam as diferenças. Regam. Constróem. Só que negativamente.

Amplificam as diferenças para, através de critérios que sabe-se lá de onde e como criaram, se sentirem melhores.

Estas pessoas não têm, como alegam, medo da influência do outro sobre nossas crianças. A perversão é mais tosca. Acho que só querem fazer com que o outro se sinta bem pequeno para, assim, se sentirem grandes.

Assim a humanidade vai se repetindo. Fala mal do carro velho do outro para chamar a atenção sobre seu reluzente importado. Acha feio o corpo da Alice Braga para valorizar sua própria falta de bunda. Ridiculariza qualquer manifestação libertária para acobertar sua falta de coragem pra chutar o balde. E acha simplória toda alegria que contraste com sua ranzinzice ou infelicidade.

Por isso a importância da resistência. Do não se deixar diminuir. Do orgulho negro. Do orgulho gay. De todo tipo de orgulho.

Menos do orgulho da ignorância, por óbvio, pois este é justamente o que atua para sobrepujar os demais.